domingo, 21 de junho de 2020

COVID-19 E OBESIDADE INFANTIL: O OVO OU A GALINHA?

Ultrapassamos três meses, desde que o Governo do Rio de Janeiro decretou a suspensão das aulas nas escolas públicas e privadas do Estado.

Tenho visto grandes discussões sobre a reabertura das academias, sob a justificativa de tratar-se de atividade essencial à saúde. Não vou entrar neste mérito no momento, somente tecer um breve comentário sobre o equilíbrio que precisamos encontrar entre a necessidade de manutenção do isolamento social e a subsistência das pessoas que dependem deste setor econômico. Não é um privilégio das academias, mas outros segmentos acabaram encontrando formas de manter, ainda que diante de consideráveis baixas, um percentual de suas carteiras de clientes. As academias, pela natureza dos serviços que prestam, não tiveram a mesma sorte.

Nosso foco, neste post, está na relação (existe?) entre a COVID-19 e a obesidade infantil.

Segundo dados do Ministério da Saúde, a obesidade é o principal fator de risco entre as pessoas com COVID-19, sendo a comorbidade presente em mais de 55% dos casos de óbitos em indivíduos com menos de 60 anos. Se considerarmos que nos óbitos acima desta idade, as comorbidades mais apresentadas foram cardiopatias e diabetes, provavelmente teríamos também na faixa acima de 60 anos a identificação da obesidade como principal fator de risco, face a conhecida relação de causa e efeito entre esta e aquelas doenças.

É importante ressaltar que a obesidade é responsável por mais de 4 milhões de mortes por ano, considerada como epidemia mundial com mais de 300 milhões de pessoas obesas ou com sobrepeso.

Estudo recente aponta que crianças acima do peso possuem 75% mais chance de serem adolescentes obesos e adolescentes obesos têm 89% de chance de serem adultos obesos. Relatórios do Ministério da Saúde indicam que 12,9% das crianças brasileiras de 5 a 9 anos são obesas.

Mas onde está a relação com a COVID-19?

Um estudo realizado com mais de 18 mil crianças nos EUA (Obesity, 2016 Nov 2. doi: 10.1002/oby.21613) demonstrou o aumento da obesidade durante as férias escolares. O número de crianças com sobrepeso passou de 23,3% para 28,7% e o de obesas evoluiu de 8,8% para 11,5%. A explicação para o aumento da obesidade infantil durante as férias é que as crianças dormem menos e têm mais atividades de horas-tela, assistindo televisão e jogando em computadores.

Sabemos que no Brasil a Educação Física Escolar não pode ser considerada como fator de combate a obesidade infantil, primeiro porque, absurdamente, ainda discutimos se esta unidade curricular deve ou não ser ministrada por profissionais especialistas na área; segundo porque não existe uma política para esse fim; terceiro porque as aulas de Educação Física, quando existem nas escolas de educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, não garantem o mínimo de continuidade para um programa de atividades físicas regulares e sistemáticas na escola.

Mas a simples rotina imposta pela escola, com horários para acordar e dormir, comer, estudar, tarefas de casa, além das crianças que têm o privilégio de participar de atividades desportivas fora da escola, já são fatores que diminuem o tempo diário de imobilismo.

O que podemos esperar destes mais de 90 dias sem escola, sem atividades físicas extraclasse, sem horário para acordar, dormir e comer? O tempo inteiro de frente para o computador estudando (algumas), jogando, batendo papo, se empanturrando de biscoitos, refrigerantes e doces?


Não precisa nem fazer pesquisa (será imprescindível que as façamos!!!) para afirmar que os efeitos da pandemia da COVID-19 sobre os índices de obesidade infantil serão catastróficos.

Os efeitos deletérios da suspensão das atividades físicas e rotineiras das crianças serão sentidos por gerações. Se hoje a obesidade mata mais de 4 milhões de pessoas no mundo, como ficará esse número diante do considerável aumento de casos de obesidade infantil?

Precisaremos realizar campanhas de conscientização da sociedade. Mais uma vez a Educação Física Escolar se mostra como caminho mais eficiente e barato para lidar com questões como o da pandemia (já é!!!) de obesidade. Para isso, precisamos assumir nosso papel como verdadeiramente profissionais da saúde, dentro da escola.

Se tivéssemos menos obesos, pelo que tudo indica, teríamos um número bem menor de óbitos pela COVID-19 no Brasil e no mundo.  Se tivéssemos realizado uma campanha de orientação e conscientização dos pais de nossas crianças durante a pandemia causada pelo corona-vírus, provavelmente teríamos menos crianças obesas, depois dos períodos de quarentena.


Voltamos ao ovo e a galinha.

Sem terceirizar responsabilidades, talvez nossos Conselhos pudessem (e ainda podem) ter um papel importante nessa campanha. Afinal, a principal função de qualquer autarquia corporativa é garantir a melhor prestação de serviços à sociedade.

Saudações.